sábado, 24 de dezembro de 2016

sábado, 10 de dezembro de 2016

O EVANGELHO NA LÓGICA DO IMEDIATISMO CONTEMPORÂNEO


O tempo não era um problema para os hebreus. Embora o tempo fosse real, não havia a necessidade de controla-lo, por meio de segmentação coerciva. Ironicamente, nossa vida pautada por datas e horas rígidas estabeleceu o controle do tempo sobre nós e não o contrário. Simultaneamente, o tempo vai perdendo seu vínculo com a realidade, especialmente com a intrusão da virtualização trazida pela cibercultura. A conexão com a internet nos desloca para um não-lugar, sem referência de tempo. Só existe uma versão unidimensional do tempo – o agora.
Em um mundo instantâneo, como se vive a espiritualidade? Acostumados com a velocidade da dromocracia – o domínio de uma sociedade em constante movimento de aceleração –, as pessoas se tornam exigentes e impacientes. Ninguém quer esperar. As respostas precisam ser instantâneas, prontas. E decodificadas, porque a impaciência se estende aos domínios da concentração (ninguém quer pensar demais para resolver qualquer questão). Vivemos em um contexto em que tudo flui. A crença pessoal é moldada para atingir o mesmo nível de fluidez que permita às pessoas terem, paradoxalmente, algum vínculo com um ponto sólido.
O cristianismo fluido, líquido, maleável e moldável é a resposta que as pessoas esperam nesse momento. Por isso os movimentos carismático-pentecostais largam na frente quando se trata de falar a linguagem das pessoas hoje. Nessa cristianismo carismático-pentecostal, a conexão com Deus é direta. E empoderadora: a energia da divindade corre nas veias em um fluxo emocional inesgotável, atendendo os anseios do presente. Não há complicações cristãs clássicas, porque o mínimo de doutrina se destaca – dose suficiente para garantir o ponto sólido de apoio. A descomplicação e praticidade do discurso religioso garante sua atualidade. A experiência se reveste de notoriedade e fornece um vínculo com os anseios materiais; afinal, tudo o que reivindicar da parte de Deus, me será concedido (confissão positiva).
A expressão bíblica do cristianismo é mais lenta. Deus Se revela pela Palavra. Ela precisa ser estudada e decodificada, o que exige um compromisso com o Espírito Santo. Estudar as Escrituras não é um investimento que garanta resultados imediatos (embora os resultados sejam garantidamente superiores). Não existe um elo emocional evidente, uma espécie de energização via fluxo emocional. O estilo de vida se apresenta contracultural ao extremo no cristianismo bíblico, capaz de alterar hábitos de maneira incômoda, com provável prejuízo para as relações interpessoais. Obviamente, o cristianismo bíblico não satisfaz as expectativas do imediatismo do mundo líquido.
E esse é o ponto: o que fazer com o cristianismo bíblico? Sua proposta desafia homens e mulheres de todas as épocas a não se conformarem com a cultura, experiência, relacionamentos e até com as expressões derivativas do próprio cristianismo. Se Deus se auto-revelou, como a Bíblia afirma, não poderíamos esperar que Ele o fizesse de maneira satisfatória aos padrões humanos, ainda mais porque tais padrões são resultado da tendência adquirida ao egocentrismo. Essa tendência é o resultado direto do pecado e se interpõe contra a vontade divina. Para salvar o homem de si mesmo, Deus precisa contrariá-lo, esnobá-lo, humilha-lo e leva-lo ao reconhecimento de sua maior necessidade: a salvação. Às vezes, isso leva tempo, porque Deus não Se pauta pela lógica do imediatismo. Mas tempo não é problema para Deus.


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segunda-feira, 5 de dezembro de 2016

A DEGRADAÇÃO DO SENSO DA PRESENÇA DE DEUS


A missão que temos é transmitir a última mensagem de advertência. Trata-se de uma responsabilidade solene. Solenidade é um conceito que escapa à contemporaneidade. Sua gravidade é diluída nos filmes de Hollywood, quando nos momentos trágicos parece haver a necessidade de um contraponto cômico. Nem as músicas religiosas atuais conseguem mais representar a solenidade. Talvez, apenas atrás do conceito de reverência, solenidade seja um dos artigos mais raros no mercado atual. Ambos são raros pela mesma razão: a degradação do senso da presença de Deus.
Em um contexto tecnológico, tudo apela aos sentidos. Mas Deus permanece invisível. Os comunicadores instantâneos, ubíquos, fomentam a ilusão de estarmos presentes em diversos lugares e de igualmente termos os amigos próximos. E com tantos elementos atraindo a atenção, o Deus Altíssimo, presente no mundo material, é ignorado. Se a presença do Criador passa despercebida, que dizer da comunhão com Ele? Que dizer da forma de responder ao Seu chamado?
A ironia fatal de uma época em que a adoração ganha contornos de metalinguagem – com músicas de adoração que falam sobre adoração –, é que os cristãos, em geral, não entendem adoração como a resposta obediente ao que Deus fez por mim. Adoração não significa sucumbir a um êxtase emocional, na tentativa de reproduzir a presença de Deus de forma carismática, como se a música e a emoção fossem elementos catalizadores para fazer um download de Deus. Adoração compreende me relacionar com Deus, nos termos que Ele estabeleceu em Sua Palavra. Isso implica em rendição, gratidão, júbilo, disposição para servir e obedecer e tantas outras coisas.
O verdadeiro adorador obedece voluntariamente. Ele quer testemunhar, porque não pode conter o amor que brota nele em resposta ao amor que fluiu do coração de Deus. Com humildade e poder, alegria e tato, sabedoria e entusiasmo, ele prega. Com suas palavras, mas com cada gesto silencioso. Prega usando a Bíblia, mas por meio de sua coerente busca para se mostrar fiel. Não há aquele sentimento estreito de alguém mecanicamente condicionado a fazer algo segundo um programa. Existem muitos manuais, planos e estratégias. Recursos não faltam. Falta é amor, transformação, vidas impactadas pela comunhão. Falta o Espírito de Deus descendo sobre Seu povo a cada manhã.
Ser um adventista é abraçar a missão. Sem os modismos que invadem a literatura evangélica a cada época. Sem o proselitismo pelo proselitismo. Viver a missão, ser a missão, pregar com o fogo de quem ama o Salvador e ama aquelas pessoas que Ele ama. Uma imensa responsabilidade, maior do que qualquer ser humano poderia imaginar.
Uma responsabilidade solene para tempos solenes.

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